PARE OLHE ESCUTE

ESCOSTEGUY Vida e obra

miércoles, 5 de agosto de 2009

CONVITE À ESTÉTICA II

O objeto estético só o é efetivamente na situação estética. Antes ou fora dela, só tem existência virtual ou potencial. Como fonte desta ou daquela experiência estética, seu potencial de disponibilidade se realiza em cada situação estética, sem jamais esgotar-se em nenhuma delas. Em termos da Teoria da Informação, o objeto estético transmite uma informação peculiar que para cada receptor, e em cada relação com ele [ou situação estética], é diferente, nova e inesgotável.
O objeto não se reduz ao imediatamente percebido; é concreto sensível, mas por sua vez significativo, e a forma com que se organiza o sensível é a forma exigida por seu significado. Por conseguinte, as qualidades do objeto não só são perceptuais mas significativas. O significativo não está nele de um modo instrumental ou extrínseco, mas sim intrínseco e necessário.
O objeto estético é físico-perceptual, e nele o sensível se acha organizado em uma forma que o torna significativo. Mas só tem esta trípice e indissolúvel existência na relação entre um sujeito e um objeto que se concretiza ou realiza em cada situação estética que, sendo sempre singular, se encontra condicionada histórica, social e culturalmente. Portanto, o objeto estético é sempre – inclusive o não produzido pelo homem no caso de uma paisagem natural – um objeto humano ou humanizado.
O objeto estético possui realidade própria, uma realidade outra ( em relação à realidade efetiva da coisa material) que, ao ser percebida, exige ser consumida como tal e não como puro engano ou ilusão. Quando percebemos a vida, a dor e o movimento frenético na pedra inerte do grupo escultural Laocoonte, não estamos diante de algo irreal, mas sim de um objeto peculiar que, na pedra trabalhada, formada, adquiriu uma realidade própria: a estética. Não somos vítimas de uma percepção enganosa, mas sim deparamos, justamente pela percepção adequada da dor ou do movimento petrificados, com uma realidade significativa graças a sua forma sensível. O irreal de um sentido é real em outro. Não estamos ante o dilema de realidade ou irrealidade do objeto estético, ou seja, ante a necessidade de situá-lo fora ou dentro do real, mas sim ante a exigência de situá-lo diante dele. Se o objeto estético está fora da realidade efetiva, tem, no entanto, uma realidade própria que excede aquela: a realidade estética. Portanto, não se trata de um objeto irreal.
O objeto estético só é efetivamente tal ao ser percebido, já que seu ser não o é de uma forma abstrata nem o de um significado puro, mas sim o de um significado que se encarna no sensível graças à forma que recebe. Mostra-se de modo desigual em diferentes percepções e existe, embora apenas potencialmente, inclusive quando não é percebido. É sempre uno, enquanto conserva sua autonomia em frente dessas diversas e inesgotáveis percepções; distinto, na medida em que não pode separar-se delas, uma vez que só ao ser percebido em diferentes situações mostra efetivamente sua existência estética.
Se o objeto estético só existe efetivamente na relação concreta, vivida, singular, que chamamos situação estética, não é um ser em si e por si, mas um ser cujo destino se cumpre ao ser percebido em sua relação com um sujeito individual. Portanto, se o seu ser não se reduz às percepções de um sujeito individual ou aos efeitos que provoca nele, já que – tanto em um caso como em outro – resiste ou subsiste, isso significa que mostra certa objetividade. É a objetividade do ser para outro que só se dá, portanto, em relação com um sujeito. Assim, se não se reduz ao sujeito, o objeto só existe real e efetivamente na situação estética; ou seja, na relação que nela contrai com um sujeito, cuja intervenção se faz necessária para que o objeto estético passe de sua existência virtual ou potencial – enquanto não é percebido – para sua existência real, efetiva, ao sê-lo.
A contemplação estética requer, pois, certa distância psíquica entre sujeito e objeto, não só para que este não se perceba dissolvido naquele, mas também para que o objeto, ao ser percebido, não se reduza à realidade vivida, cotidiana, do sujeito. O distanciamento da arte de uma realidade humana vivida não mostra “desumanização”, porque sendo a obra artística um produto humano, não pode deixar de ter sempre um significado humano.
Além disso, a arte expressa certa realidade humana, ou relação do homem com o mundo, com maior riqueza, riqueza ou profundidade. E este mundo, que não é um mundo determinado mas sim criado pelo artista, e no qual se passa de uma realidade “vivida” e uma realidade humana mais profunda, é o que constitui o centro de gravidade do objeto que se oferece à contemplação estética. Contemplação que só ocorre, por sua vez, se o sujeito que se situa ante o objeto, longe de fundir-se com ele, convertendo-o em uma projeção sua, se mantém a certa distância.
Quando o sujeito contempla essa outra realidade que é exatamente a do objeto na situação estética, o humano como “centro de gravidade” se desloca da “realidade vivida” para outra, a estética, mais plena e profundamente humana. Existe, pois, uma dialética da união e da separação, da identidade e do distanciamento de sujeito e objeto que constitui a própria natureza de sua relação na situação estética.

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